A unidade de uma nação ou a unidade internacional entre muitas nações, como no seio da UE, são geralmente construídas em torno de certos sentimentos, sejam eles religiosos, linguísticos ou culturais. O vasto continente da União Soviética estava unido com base num sentimento antiexploração entre os camponeses contra os ricos.
Este sentimento alimentou a Revolução Bolchevique e estabeleceu um forte Estado comunista. No entanto, no fim da Guerra Fria, depois do sonho do proletariado de justiça e igualdade se ter transformado durante muitos anos num regime opressivo, os ideais socialistas de Marx e Lenine já não eram capazes de unificar a nação. Consequentemente, a União Soviética dispersou-se em muitas nações unidas em torno de sentimentos linguísticos, religiosos, étnicos e geográficos. Será demasiado rebuscado considerar que algo semelhante pode acontecer na Europa?
Os países que, internamente, têm pouca disparidade socioeconómica, têm tradicionalmente mostrado um rápido crescimento económico. Exemplos disso são os países Escandinavos. A Noruega, por exemplo, é uma das nações mais equitativas do mundo, mas no atual clima económico, as desigualdades económicas estão a aumentar mesmo na Noruega, e ainda mais no resto da Europa.
Em vez de uma diminuição das disparidades de rendimentos e do desenvolvimento económico generalizado, os países e as pessoas estão a ficar cada vez mais polarizadas entre os que têm e os que não têm. Sonhos de coesão social e paz não são suficientes para manter a economia e estabilidade social na Europa. De modo a manter a paz, uma prosperidade relativa deve ser generalizada entre os países da União.
Há também problemas na vertente política. À medida que a União aumentou de tamanho a partir dos seus seis países membros originais para 28, a distância entre os decisores politicos em Bruxelas para as pessoas nas ruas da Suécia, Portugal, Irlanda, Roménia e Itália aumentou.
À medida que a crise económica se intensifica, existe uma perceção crescente entre as pessoas dos vários países membros de que o Parlamento Europeu é menos sensível aos interesses das pessoas e, pelo contrário, está cada vez mais atento aos interesses dos grandes grupos de empresas. Nas palavras do ativista antipobreza John Hilary,
“Tendo passado grande parte dos últimos 15 anos a lutar por políticas mais justas dentro da União Europeia, tenho agora uma profunda desconfiança em relação às suas instituições. A experiência amarga ensinou-me o quão grande é o défice democrático no centro do programa europeu. O fórum supremo de política da UE, o Conselho de Ministros, reúne-se em assembleia sem qualquer forma de supervisão externa. A Comissão Europeia poderosa, mas não eleita, segue de perto o rumo que lhe foi dado pelas dezenas de milhares de lobistas empresariais que operam dentro da bolha de Bruxelas. O Parlamento Europeu (PE) continua a ser uma “maravilha desdentada”, mesmo depois das recentes reformas do Tratado de Lisboa.”
A UE luta com problemas mais profundos e complexos do que meras tensões históricas e incompatibilidades entre o mercado e as forças sociais. Estes problemas fundamentais são sistémicos e inerentes à arquitetura política original da UE e à economia de mercado que serve.
Aumento da Desconfiança
Em 1985, a desintegração dos países por detrás da Cortina de Ferro foi tida como impensável. No entanto, no início da década de 1990, o impensável tinha sido declarado inevitável. O salto da Europa de Leste do “impensável” para o “Inevitável” torna este momento histórico divisor de águas um cenário importante da nossa tentativa de contemplar o futuro da história Europeia.
Na verdade, a desintegração da União Europeia era impensável apenas há alguns anos, mas hoje, devido à crise económica que se apoderou de toda a Europa, isto, de acordo com muitos especialistas, tornou-se uma possibilidade real.
A crise económica europeia demonstrou que o risco de uma UE desintegrada não é apenas um dispositivo retórico por parte dos políticos nervosos para impor medidas de austeridade. Os problemas atualmente com que a UE se confronta são verdadeiros e não são apenas económicos. O sistema político europeu também enfrenta a oposição dos povos cujo futuro foi criado para proteger. As estatísticas mostram que o envolvimento político e a confiança pública na UE nunca foram tão baixos. Os receios de que a Zona Euro possa entrar numa nova recessão são autênticos. Isto desencadeia uma série de questões fundamentais sobre o futuro da própria UE, e do euro, a moeda da União. A economia europeia parece estar numa crise profunda e, talvez, fundamental. Consequentemente, economistas, políticos e pessoas comuns perguntam-se: quão forte é a base económica e política em que assenta a Zona Euro?
A participação eleitoral na Zona Euro é a mais baixa da sua história, levando muitos a questionar ainda mais os verdadeiros motivos dos decisores políticos e o quão democráticos e sólidos são os seus processos de tomada de decisão? A crise financeira reduziu drasticamente a esperança de vida dos governos e inspirou novos partidos populares em oposição à UE. O humor público tornou-se num silencioso coro de pessimismo e raiva.
O inquérito sobre o futuro europeu financiado pela Comissão Europeia e publicado em abril de 2012, mostrou que a maioria das pessoas concorda que a UE é um lugar decente para viver, mas a falta de confiança no desempenho económico da União e na sua capacidade para desempenhar um papel importante na política global está a aumentar.[1] Mais do que seis em cada dez europeus estão agora convencidos de que a vida daqueles que são crianças hoje será mais difícil do que a vida das pessoas da sua própria geração.
Ainda mais alarmante, quase 90 % dos europeus vêem um grande fosso entre o que o público quer e o que os seus governos fazem. Apenas um terço dos europeus sentem que o seu voto conta na UE e apenas 18 % dos italianos e 15 % dos gregos sentem que o seu voto conta mesmo nos seus próprios países.
O que vai acontecer à UE se estados mais pobres como Portugal, Itália, Espanha e Grécia sairem do Euro, reduzir as suas perdas e traçar um novo caminho económico com diferentes políticas económicas? Como a experiência soviética demonstrou, não só a falta de reforma, mas, mais importante, uma série de reformas mal orientadas do centro em si também pode levar à desintegração de uma união económica ou de um país. Em tempos de crise, os políticos estão em busca de uma “bala de prata” para resolver todos os problemas.
Mas quando os problemas são mais sistémicos do que as soluções superficiais contidas nas propostas de reformas de resgate, estas medidas súbitas podem facilmente tornar-se a causa de outros problemas.
Por outras palavras, não só é possível que a UE se desintegre da periferia, como já começou a fazer, como poderia mesmo desintegrar-se a partir do próprio centro. Sim, alguns economistas até previram que a Alemanha, o coração da união, poderia, devido à sua estreita ligação ao Euro, ser uma causa substancial de um eventual colapso.
Como Criar uma Unidade duradoura na Europa?
Para criar uma unidade duradoura na Europa, a fundação económica e política tem de se basear em valores duradouros, como a combinação da democracia política e económica. Neste momento, a democracia política é autocrática e burocrática e isso tem que mudar. A este respeito, estamos de acordo com a estratégia do Diem25 para democratizar a UE.
Mais importante ainda, a UE tem que s e democratizar e descentralizar economicamente. Isto significa que os países mais pobres da periferia precisam, em primeiro lugar, de receber investimentos para desenvolver indústrias sustentáveis, para que possam competir melhor no mercado e aumentar os salários da sua força de trabalho. Em segundo lugar, é necessário que haja uma mudança de política a longo prazo, a nível europeu, para descentralizar a economia de toda a Europa, para que as regiões e as nações com laços estreitos possam prosperar e tornar-se mais autossuficientes. Isto revitalizará as economias locais de toda a Europa, mantendo simultaneamente a união cultural e política. Em terceiro lugar, a agricultura na Europa tem de se desfazer de ser essencialmente à base de carne e leite para cultivar mais frutas e legumes, ao mesmo tempo que cria um plano a longo prazo para passar a métodos de cultivo orgânicos. Em quarto lugar, um programa de investimento verde em grande escala precisa de transformar a Europa numa área que se torne autossuficiente em energia verde. Em quinto lugar, um plano a longo prazo para transformar as empresas de EU em cooperativas transformará os sectores da indústria e da tecnologia numa economia dinâmica que cria mais igualdade e prosperidade. Cimentar estas mudanças macroeconómicas em grande escala serão as obrigações unificadoras através da cultura comum e dos valores do iluminismo europeu, que deve estender-se não só aos direitos básicos humanos, mas também à natureza.
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